Um dia após o ultraliberal Javier Milei se tornar o candidato mais votado nas eleições primárias da Argentina, os mercados acordaram em polvorosa no país vizinho. O dólar paralelo, chamado de “blue”, disparou 11% depois que o Banco Central do país também subiu os preços do dólar oficial em 22%.
A nação tem a compra de moeda estrangeira controlada pelo governo, porque sofre com uma escassez de reservas histórica em seus cofres, cada vez mais baixas. Para incentivar ou frear determinados setores, portanto, o país impõe cerca de dez tipos de cotação diferentes, enquanto o câmbio paralelo, praticado em casas de câmbio clandestinas, flutua livremente.
Nesta segunda (14), depois das eleições primárias, o Banco Central ligado ao governo de Alberto Fernández, cujo ministro de Economia é o candidato presidencial Sergio Massa acelerou uma desvalorização do peso que está em curso desde que se anunciou um acordo para o pagamento da dívida do país com o FMI (Fundo Monetário Internacional).
O dólar oficial “mayorista” ou “atacado”, usado por instituições financeiras, importadores e exportadores, saltou 22%, a 350 pesos, e arrastou todos os demais. Ele deve ficar fixo neste valor até as eleições, conforme uma fonte oficial disse à Reuters. O dólar “minorista” ou “varejo”, pouco usado pela população em geral, em casas de câmbio ou bancos, subiu na mesma proporção, para 365 pesos.
Com isso, disparam em proporção parecida o dólar turista, para gastos dos argentinos em compras abaixo de US$ 300, e o dólar Qatar, para gastos acima desse valor, o mais caro de todos. Já o dólar “blue”, que havia fechado em 605 pesos na sexta-feira pré-eleições (11), saltou a 670 pela manhã (11%) com as incertezas e deve flutuar ao longo do dia.
“Enfatizamos que Milei, durante a campanha, falou em dolarização, apesar de alguns de seus assessores terem assegurado posteriormente que uma medida semelhante não poderia ser implementada logo após a posse”, disse o Grupo SBS.
O Banco Central local teve que vender cerca de US$ 225 milhões de suas reservas limitadas na semana passada para atender à demanda do mercado e manter uma depreciação controlada da moeda. A autoridade monetária decidiu também elevar a taxa básica de juros em 21 pontos básicos, para 118% ao ano.
“A autoridade monetária entende ser conveniente readequar o nível das taxas de juros dos instrumentos de regulação monetária, em linha com a recalibragem do nível do tipo de câmbio oficial”, explicou o BC.
“Isso, de forma a ancorar as expectativas cambiais e minimizar o grau de repasse aos preços, tende a retornos reais positivos sobre os investimentos em moeda local e a favorecer o acúmulo de reservas internacionais”, completou.
Para a economista Natalia Motyl, o resultado eleitoral influenciou diretamente na queda do peso argentino. “Milei conseguiu vantagem e por isso o mercado vê que não vai ter uma desvalorização, e sim uma dolarização, então vai ter uma demanda maior por cobertura”, disse.
“Dias de reação exagerada do mercado de câmbio estão chegando”, avaliou. A mínima do peso informal era de 610 unidades, atingida na quinta-feira. Na semana passada, ele chegou a atingir 698 pesos a quatro dias da eleição, o que levou o ministro da Economia, Sergio Massa, a ameaçar usar de “todos os instrumentos” para conter a situação.
VENCEDOR REPRESENTA VOTO RAIVOSO CONTRA POLÍTICA TRADICIONAL
O deputado ultraliberal Javier Milei, representante do voto raivoso contra as forças políticas tradicionais, foi o principal vencedor das eleições primárias realizadas neste domingo (13) .
O autointitulado “anarcocapitalista” recebeu 30% dos votos com 97% das urnas apuradas. Logo atrás veio a coalizão de oposição Juntos por el Cambio, com 28,3%. A aliança peronista e governista União pela Pátria ficou em terceiro, com 27,2%, o pior desempenho do movimento desde que as eleições primárias foram implementadas, há 12 anos.
A guinada à ultradireita no país ficou clara também com a vitória de Patricia Bullrich, mais linha-dura, sobre Horacio Rodriguez Larreta, mais moderado, na disputa interna do Juntos por el Cambio. A ex-ministra da Segurança de Mauricio Macri (2015-2019) garantiu sua vaga no primeiro turno de outubro com 17% dos votos nominais, ante 11,3% do dirigente de Buenos Aires.
O ministro da Economia peronista, Sergio Massa, por sua vez, angariou 21,4% dos votos. Trata-se de um resultado histórico para uma eleição primária presidencial no país, já que desde 2011 as alianças peronistas acumulavam as maiores porcentagens.História por JÚLIA BARBON • 2h