Metropolita Pavlo, da Igreja Ortodoxa Ucraniana, é investigado por defender a Rússia e incitar o ódio inter-religioso. Clérigo é abade do Mosteiro das Cavernas e se nega a deixar o local após ordem do governo ucraniano.
Um tribunal de Kiev decretou neste sábado (01/04) a prisão domiciliar do metropolita Pavlo, informou a mídia ucraniana. A determinação vale por 60 dias e ele deverá ser monitorado por tornozeleira eletrônica. O Clérigo é membro da Igreja Ortodoxa Ucraniana (IOU), ligada canonicamente ao Patriarcado de Moscou, e abade do Mosteiro das Cavernas, palco de um conflito religioso mais amplo que se desenrola em paralelo com a guerra.
A Procuradoria Ucraniana está investigando Pavlo por justificar as ações da Rússia e por incitar o ódio religioso, devido aos seus ataques públicos à Igreja Ortodoxa da Ucrânia (IOdaU), canonicamente independente de Moscou.
Mais cedo no sábado, o Serviço de Segurança da Ucrânia (SBU) notificou Pavlo de que ele era suspeito de dois crimes: incitar inimizade inter-religiosa e justificar a agressão russa. O religioso de 61 anos nega as acusações e diz que elas têm motivação política.
“A lei e a responsabilidade por violá-la são as mesmas para todos, e uma batina não é garantia de intenções puras”, disse o chefe da SBU, Vasyl Maliuk, em um comunicado, acusando a Rússia de usar a religião “para promover a propaganda e dividir a sociedade ucraniana”.
O governo ucraniano lidera uma repressão à IOU por seus laços históricos com a Igreja Ortodoxa Russa, cujo líder, o patriarca Cirilo, é um leal apoiador do presidente russo, Vladimir Putin, e defensor da invasão da Ucrânia pela Rússia.
Protestos pró e contra Pavlo ocorreram nas proximidades do mosteiro.
No entanto, o metropolita Pavlo e outros monges e padres ortodoxos que vivem no mosteiro disseram que não deixarão o local, enquanto aguardam o resultado de uma nova ação judicial que visa impedir o despejo.
O Mosteiro das Caverna é, na verdade, uma espécie de complexo de mosteiros com cerca de 140 edifícios. Como nos tempos soviéticos, é de propriedade do Estado – e o governo ucraniano determina quem pode usá-lo. O ministro da Cultura da Ucrânia, Olexander Tkachenko, rescindiu o contrato de arrendamento com a IOU alegando que o clero teria erguido novos edifícios no local e reformado os já existentes, violando as regras estabelecidas.
No entanto, o motivo real seriam as suspeitas de que membros da IOU estariam trabalhando secretamente para a Rússia. A IOU acusa o governo ucraniano de perseguição religiosa. Enquanto a situação não se resolve, os monges seguem no local sagrado e celebrando missas, apesar da ordem do governo.
Acirramento das tensões
s monges têm o apoio de numerosos fiéis, que fazem vigília no mosteiro. Por outro lado, protestos contra a IOU também se espalham pelo país.
A IOU tem sido historicamente um dos principais elos entre os ucranianos e a Rússia, que estaria usando a congregação para promover sua influência. Os serviços de inteligência ucranianos alegam que, em incursões no mosteiro no final do ano passado, encontraram materiais de propaganda russa. Desde o início da invasão, as autoridades ucranianas detiveram vários prelados da IOU sob a acusação de benzer o exército russo que está invadindo o país e de passar informações aos militares inimigos para ajudá-los em suas operações.
Neste domingo, na Catedral de Khmelnytskyi, no oeste da Ucrânia, um padre da IOU agrediu um voluntário do exército ucraniano (que havia sido ferido na linha de frente), depois que o soldado repreendeu os presentes por manterem sua afiliação com a igreja.
“Quantas pessoas mais terão que morrer para você pararem de ir à [igreja do] Patriarcado de Moscou?”, teria gritado o soldado durante uma missa, conforme explicou o deputado Khmelnytskyi Víktor Burlyk em sua conta no Facebook, onde também postou um vídeo do momento do ataque.
O primaz da IOdaU Epifânio 1 acusou recentemente o metropolita Pavlo de “aterrorizar” seus monges. O major-general da reserva da SBU Viktor Yagun disse neste domingo que a IOU tentar provocar os fiéis ucranianos que se manifestam no Mosteiro das Cavernas com a intenção de produzir “um banho de sangue” para desacreditar a democracia ucraniana.
Rompimento com o Patriarcado Russo
Em maio de 2022, a IOU rompeu com o patriarca russo Cirilo e a Igreja Ortodoxa Russa, em protesto contra o fervoroso apoio do líder religioso à guerra. A IOU reafirmou sua independência de Moscou, removendo a adição “Patriarcado de Moscou” de seu nome – até então, ela era referida como Igreja Ortodoxa Ucraniana do Patriarcado de Moscou (IOU-PM). Em maio do ano passado, em um novo estatuto, a IOU descreveu-se como independente, mas não como autocéfala.
Muitos ucranianos duvidam da autenticidade da ruptura e pedem aos fiéis desta congregação, caso realmente queiram cortar todos os laços com Moscou, que se filiem à IOdaU.
Cumprindo um antigo desejo do movimento de independência da Ucrânia, Kiev criou em 2018 sua própria igreja ortodoxa autocéfala independente de Moscou, chamada de Igreja Ortodoxa da Ucrânia (IOdaU), que foi reconhecida em seguida, em Istambul, por Bartolomeu 1º, uma espécie de “pontífice honorário” dos 260 milhões de cristãos ortodoxos de todo o mundo.
(EFE, AP, AFP, DPA, Reuters)
Monges se negam a deixar mosteiro
A decisão sobre a prisão domiciliar de Pavlo veio três dias depois de o religioso, juntamente com cerca de 200 monges e 400 seminaristas da IOU, se recusarem a cumprir uma ordem do governo da Ucrânia de deixar o Mosteiro das Cavernas.
Os monges que usam a propriedade são da IOU. O mosteiro, porém, pertence ao governo ucraniano, que notificou a IOU no início deste mês sobre rescisão do contrato para o uso do local.